Breno Melaragno, sócio do SS&R, e outros especialistas falam sobre o caso do vândalo que destruiu relógio de Dom João VI no Planalto
Identificado como o responsável pela destruição do relógio de Dom João VI no Palácio do Planalto, Antônio Cláudio Ferreira poderá receber uma pena de até 30 anos de prisão. Além de associação criminosa, ele deve responder por crimes como tentativa de abolir com violência o Estado Democrático de Direito e ato para depor o governo legitimamente constituído. O mecânico ainda é investigado pela Polícia Federal por destruir um bem protegido por lei e um patrimônio com valor histórico. A relíquia é uma das duas peças existentes do relojoeiro francês Balthazar Martinot.
Na representação pela prisão preventiva de Ferreira, a qual O GLOBO teve acesso, a PF cita quatro artigos do Código Penal e dois da chamada Lei de Crimes Ambientais. Nesses dispositivos, é imputado ao mecânico a destruição de patrimônio da União e outros itens protegido pela legislação.
Professor de Direito Penal da PUC-Rio, o advogado André Perecmanis explica que, a partir do eventual indiciamento de Ferreira, o Ministério Público Federal poderá denunciá-lo por todos ou parte dos delitos pelos quais ele é investigado. Ainda assim, após o curso do processo, caso ele seja condenado, será realizada a chamada dosimetria da pena, cálculo que define a pena que deverá ser cumprida em uma eventual condenação:
— Dependendo de como for feita a acusação, a pena pode variar muito. Assim, se a Procuradoria-Geral da República entender que o réu praticou várias ações independentes entre si, as penas de cada um dos crimes serão somadas. Por outro lado, se o Ministério Público entender que os vários crimes tinham relação entre si, seja porque cometidos com apenas uma ação ou ainda porque um era a continuação do outro, o juiz deverá considerar a pena do delito mais grave e aumentá-la, a depender da hipótese, em no máximo metade ou dois terços.
Já o criminalista Breno Melaragno, também professor da PUC-Rio, pondera que o tempo máximo de cumprimento de pena em território brasileiro passou de 30 a 40 anos desde a aprovação do Pacote Anticrime, em 2020. Durante esse período, o preso tem garantido o direito a progressão de regime, de forma gradual, e ainda ao livramento condicional, em que o encarcerado é posto em liberdade se houver preenchido determinadas condições impostas legalmente.
Para chegar até Ferreira, investigadores seguiram diferentes pistas, ouviram testemunhas, monitoraram imagens de rodovias e utilizaram tecnologia de reconhecimento facial. A cena explícita de vandalismo no Planalto, revelada pelo programa Fantástico, da TV GLOBO, impulsionou uma série de denúncias anônimas sobre a identidade do golpista. Duas delas, que o apontavam como principal suspeito, foram feitas à 9ª Delegacia Regional de Polícia de Catalão, cidade localizada a 260 quilômetros da capital de Goiás.
Ao checar as informações, policiais levantaram dados de um veículo do vândalo e vasculharam registros de câmeras de rodovias. Esse banco de dados apontou que o automóvel havia se dirigido para Brasília em 2 de janeiro e voltado para Catalão na madrugada do dia 9 do mesmo mês, logo após as invasões às sedes dos Poderes.
A partir daí, a PF começou a analisar a foto do suspeito. A imagem do vândalo foi submetida à avaliação de um programa de reconhecimento facial — que a comparou com vídeos do sistema de segurança do Planalto. O resultado foi atestado por dois peritos experientes.
(*Matéria publicada no Jornal O Globo. Leia aqui.)